segunda-feira, abril 07, 2008

Aconteceu há dez anos!

Quando a carrinha branca parou na berma da estrada, como nos velhos filmes de aventuras, eu já sabia que o meu destino podia mudar naquele momento. Drogados, era tudo o que me esperava no fim da curta viagem, um mundo desconhecido, gente de outro planeta, em recuperação neste planeta, prisioneiros voluntários que não conseguiam tomar conta de si! Sou de outro tempo, do tempo das tabernas, dos pecados individuais e intransmissíveis, sem necessidade de bengalas e adjectivos, aquela lepra fazia-me confusão! Mas na altura, desempregado e desocupado, decidi aceitar o que me ofereciam, a estranha tarefa de acompanhar e vigiar, em horário nocturno, o andamento de uma comunidade terapêutica, tal era o nome destes armazéns de jovens dependentes, por certo inimagináveis pelos nossos bisavós!
Não era portanto um missionário que ali entrava, mas alguém que também precisava de virar uma página pouco propícia da sua vida, um espírito neutro, na expectativa, mas que mantinha um indiscutível ar de superioridade!
Porém, como na fábula, os vencidos acabam por assimilar os vencedores quando estes não têm tanta razão como julgam, e assim, comecei a descobrir com alguma surpresa que aquele local envenenado era afinal um bálsamo para a minha alma subitamente renascida! E maior surpresa ainda quando dei comigo a admirar a coragem daqueles resíduos humanos, erguendo-se para saírem do poço escuro em que tinham caído! Perguntava-me então, se comparado com eles, os meus parcos esforços para aperfeiçoar a minha vida valeriam de alguma coisa! E a resposta nunca era lisonjeira.
É apenas uma data, mas gostava de a assinalar no interregno porque é de interregno que se trata – cumpriram-se dez anos que levo nesta cruzada! E já não me arrependo de ter entrado naquele final de dia, naquela carrinha branca.

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