quinta-feira, fevereiro 28, 2008

Aulas de substituição!

Não pagamos.
Substituam o ensino, retirem-no das garras da propaganda, deste regime ou de outro, não intoxiquem as criancinhas! Deixem os livros ao critério das escolas, e as escolas ao critério dos pais, não tenham medo da diversidade, respirem fundo... Vivam! Um país à defesa é um país derrotado. Sobre os professores, que não têm culpa de ter nascido neste cativeiro, só posso repetir-me na seguinte reflexão: - "E daí se conclui, ao contrário do teorema socialista, que o ensino entregue ao Estado é sempre uma desgraça. E maior desgraça é ser utilizado para garantir um emprego no mesmo estado. No tempo da outra senhora, as academias militares (e os seminários) também foram utilizados para os mesmos efeitos, ou seja, para fins que nada tinham a ver com a vocação requerida. Os resultados eram previsíveis - perdemos Fé e Soberania."
Cabe hoje aos professores evitar que percamos sabedoria.
Mas não está fácil.

sexta-feira, fevereiro 22, 2008

Crisis! What crisis?!

Parece-me que era assim que se chamava um dos álbuns dos ‘Supertramp’, lembrança que me permite revisitar os meus vinte anos, vá lá, vinte e tal! Na capa, recostado numa cadeira de praia, em traje de praia, um homem tomava turisticamente uma bebida qualquer, por uma palhinha. Nada de anormal, a não ser a paisagem que o rodeava, uma espécie de lixeira! Isto lembra-me a contradição entre os discursos de Sócrates e a nossa realidade. Por exemplo, o jornal ‘Público’ publicava hoje o seguinte título: “Portugal à beira de crise social de contornos difíceis de prever, considera a Sedes” – e prossegue – “Associação alerta para falta de confiança nos políticos e presença asfixiante do Estado na sociedade”. Em letra mais miúda, resume: “O (Estado) demite-se do seu dever de isenta regulação, para desenvolver duvidosas articulações com interesses privados, que deixam um perigoso rasto de desconfiança”. Ora bem, independentemente da credibilidade que queiramos atribuir àquela Associação, o que ela diz todos nós sabemos, todos nós sentimos esse “difuso mal-estar”, a “degradação da confiança no sistema político”; os “sinais de crise nos valores”, e da minha lavra, uma comunicação social domesticada, afunilada; a criminalidade que aumenta ao ritmo da impunidade, sinónimo de injustiça, que é a pior das doenças do Estado.
No extremo oposto, aparece o primeiro-ministro, optimista, com ou sem fato de treino, a reclamar progressos, melhorias, incentivando os portugueses a deixarem-se ‘modernizar’ por ele, o grande timoneiro que nos há-de arrancar das trevas!
Mas como é que podemos ter confiança no sistema político, e neste governo, quando numa questão tão delicada quanto óbvia, refiro-me aos aviões que terão aterrado em Portugal a caminho de Guantanamo, a primeira palavra que se ouve de Sócrates é um não, a que se acrescenta uma caricata justificação - “não temos razões para acreditar nessa possibilidade”!
Enfim, continuamos com os ‘supertramp’, de óculos escuros e palhinha, refastelados na lixeira!

quinta-feira, fevereiro 14, 2008

Serviço Público

Nem sempre temos a noção da importância dos nossos gestos, muitas coisas fazemos, distraidamente, sem medir o alcance, que acabam por ser úteis, por servir a alguém, e só por isso são úteis, não é evidentemente o caso de alguns textos que de propósito publico no interregno, palavras dos outros, estruturadas e estruturantes, a que voltamos sempre porque têm valor, são tinta permanente que todos podem ler, de que todos podemos beneficiar, ficam para além das escolhas acessórias que salutarmente nos dividem.
A Evocação do Terreiro do Paço é um desses trechos que poderia permanecer, sem temer confronto, junto de outros, e cito de memória, a conversão de António Sardinha, pelo próprio, as quatro repúblicas e a monarquia, de Barrilaro Ruas, a eterna poesia de Torga e esse monumento épico a Maggiollo de Gouveia, da autoria de Ruy Cinatti!
E será por este último que a página se vira, voltando atrás, revisitando a história, para tentar compreender o que se passa hoje em Timor. Continuando a respeitar os desígnios do poeta.

sexta-feira, fevereiro 08, 2008

A Evocação do Terreiro do Paço

Senhores Duques de Bragança
Minhas Senhoras e Meus Senhores

Começo por saudar o Senhor Dom Duarte investido pela Divina Providência na responsabilidade e na honra de representar a Casa Real portuguesa e que, com igual honra, patriotismo e, sobretudo, filial espírito de fé católica, assim tem vivido.

(I)

Fui convidado pelo Exmº Sr Presidente da Comissão ‘Dom Carlos 100 anos’, D. Nuno Bragança Van Uden, a tomar palavra no momento em que aqui nos juntamos para prestar homenagem ao Sr Dom Carlos, rei de Portugal, que, juntamente com seu filho, o príncipe herdeiro, o Sr Dom Luís Filipe, foram neste lugar atingidos por balas de ódio, por balas de cegueira, de injustiça e de ressentimento, como sempre capazes de levar avante uma qualquer das versões do engenho da violência.

Não o faço, obviamente, como delegado político, que não sou. Tão pouco como historiador, que de igual modo também não sou. Não trago, aliás, delegação de poderes de ninguém.

Apenas quero dar voz a um sentido da justiça e gratidão perante a memória de um rei que tem tanto de notável quanto de injustamente maltratado. Primeiro pelos seus contemporâneos, grande parte dos quais (e penso em não poucos daqueles que tinham maiores responsabilidades publicas) sem o mesmo esclarecimento e lealdade de atitudes, e posteriormente por uma historiografia que só agora parece pronta para dar do rei D. Carlos a sua real dimensão e dar dela razoável noticia perante a opinião pública. “Não há cousa que ocupe menor lugar do que um caído” dizia o grande pregador António Vieira.

Mas não posso deixar de chamar a atenção para o facto de ser um padre a pronunciar-se nesta circunstância. Significa isso que se pretendeu o testemunho de alguém chamado por Deus, Senhor da história, a dizer uma palavra que tenha tanto de verdade quanto de apelo construtivo; que sem esquecer o sangue das vítimas promova a reconciliação; que reconhecendo o passado não se fixe impotente no que é antigo; que não esqueça o honrado desafio que é ser fiel a Deus protagonizando a história hoje; que lembre que a nobreza é, antes de mais, coisa de sangue da caridade, quer dizer, coisa que tem que ver com o fluxo de fé, esperança, e amor dado hoje em empenho no combate por Cristo Rei e não a celebração atrasada e estéril de vaidades infrutíferas; e que quem assim não pensa não pensa segundo o Evangelho de Cristo.

(II)

Por isso a minha, e a nossa, sentida homenagem, a um rei patriota, de um modo tal que há cem anos escolheu passar por este lugar a descoberto por entre o povo, por entre o seu povo, porque se sabia escolhido como o primeiro com a responsabilidade de estar com o seu povo, e assim o fez em toda a sua intensa e amputada vida.
Ora falar de povo não é dar voz ás massas impessoais. Não é, tão pouco, seduzir demagogicamente, em nome dos mais desprotegidos socialmente.
Povo é a trama originária dos homens que, por condição, país e desenrolar histórico, estão unidos na vida e no destino. Povo são os homens que se encontram vinculados inquebravelmente nas suas raízes últimas e nas leis essenciais da natureza e da vida. A humanidade vista na sua condição originária: isso é o povo. Um homem tem a condição de povo quando leva em si essa totalidade. Neste sentido como não reconhecer em D. Carlos um homem do povo.
Com efeito, povo é uma realidade com uma identidade viva. O povo não imita, como o publico: conserva a própria personalidade, apropria-se do que pede emprestado e faz seu o que vem do exterior. Muitas vezes, quando o público vai ao centro comercial o povo defende a sua língua e cânticos; quando o público se distrai com o circo o povo mostra-se devoto...O público tem 150 anos; os anos do povo não se contam. O público passa, o povo é eterno. O público tem a globalização, o povo a terra. O público e o povo têm os seus epítetos. Entre nós, o público quer ser famoso e ter bem-estar; o povo é cristão e acolhe a missão que lhe é designada pela Divina Providência.
Por conseguinte, era este povo que D. Carlos sabia representar. Representar quer dizer estar presente. Significa avançar em nome de …. Pelos outros, por todos. O paradoxo da representação é lembrar os outros de um modo tal que se esquece a si mesmo. Assim Jesus Cristo, o Santo dos santos. Assim todos os santos (e nesta hora é dever lembrar, certamente, o mais nobre dos antepassados de D. Carlos, o Santo Condestável), assim os heróis que vencem a máxima lembrança de si mesmos, o orgulho e as menoridades da vaidade.

(III)

Por isso a minha, e a nossa, sentida homenagem a um rei perspicaz e com elevado sentido de Estado, face à árdua procura de servir a Pátria dentro da lei, perante partidos que pareciam o mais das vezes empenhados, sobretudo, em ampliar o seu quinhão de lucro; rei inteligente e eficaz na busca de uma outra presença internacional do seu país que protegesse os interesses da soberania territorial e que guardasse e promovesse a dignidade de Portugal;

Por isso, ainda, a minha e a nossa sentida homenagem a um rei corajoso, face à agitação das demagogias febris ágeis a publicitar contra a sua pessoa, rei corajoso face aos truques políticos organizados contra a governabilidade do Estado, rei corajoso face à face oculta de sociedades secretas votadas a boicotar e subverter o regime e que, na verdade, soube preferir o desígnio nacional às hesitações filhas de taticismos. De facto, D. Carlos expressa um entendimento da função régia que não tem origem na plutocracia, na febre do poder, em arbitrariedades ideológicas. Creio poder dizer de modo sereno que D. Carlos representa outro tipo de motivação para o exercício do poder: a vontade de servir, ou melhor ainda, a vontade de bem servir.
E foi por isso que D. Carlos não virou a cara na hora de usar autoridade. A palavra autoridade provem do latim e significa etimologicamente promover. A destruição da verdadeira autoridade não conduz a uma liberdade melhor, mas antes ao seu contrário: à coação e à violência. Com efeito, como os anos que se seguiram ao regicídio assim o provaram!

Por isso, finalmente, a minha, e a nossa, sentida homenagem a um rei nobre e distinto pelas suas qualidades pessoais, valente, ilustrado e tenaz, que amava a sua terra, que a conhecia e valorizava, pintando-a nos seus quadros com excelência, ilustrando a sua realidade com as suas aguarelas e com os seus relatórios para diversas entidades cientificas, promovendo com elevação a marca portuguesa. Homem honrado, portanto. Ora a honra é, pelo menos, não perder a identidade. Melhor, é fazer crescer a identidade, abrindo-a às melhores e mais virtuosas possibilidades que traz em si mesma.

(IV)

Enfim, o dia de hoje obriga-nos a pensar no mistério do mal, essa manifestação da liberdade fracassada, não reconciliada e irreconciliável, entropia negativa do espírito, que atira para baixo, e vai deixando consumido e destruído o tempo que lhe foi dado.
Mas o dia de hoje não reclama um ajuste de contas. É apenas um dia de memória, o que é diferente de estarmos aqui reunidos a visitar o museu da história. Porque a história, por vezes, reduz os acontecimentos apenas a curiosidades. E cito Peguy: “A história consiste essencialmente em passar ao lado do acontecimento. A memória consiste, essencialmente, por estar dentro do acontecimento, em não sair dele, em permanecer nele e reconstitui-lo por dentro…”
Com efeito, creio que é preciso uma insistência na memória face à actual cultura do esquecimento.
Na verdade, quis o Sr Dom Duarte que o dia de hoje fosse assinalado sob o signo da reconciliação. Certa vez, disse o Papa João Paulo II, ele mesmo vitima miraculosamente salva de um atentado, que “o limite imposto ao mal, cujo artífice e vítima é o homem, em última análise é a Misericórdia Divina.” E por estes dias, disse também o Papa felizmente reinante: “ O amor torna-se o critério para a decisão definitiva sobre o valor ou a inutilidade duma vida humana.” Assim, como não bendizer a Deus por este rei que amou e serviu até ao fim o seu povo!

Por isso termino a minha intervenção rezando e convidando a rezar comigo. E digo um salmo:

Deus se compadeça de nós e nos dê a Sua benção,
Resplandeça sobre nós a luz do Seu rosto.
Na terra se conheceram os Vossos caminhos
e entre os povos a Vossa salvação!
Os povos Vos louvem, ó Deus!
Todos os povos Vos louvem!
Alegrem-se e exultem as nações,
porque julgais os povos com justiça
e governais as nações sobre a terra.
Os povos Vos louvem, ó Deus,
Todos os povos Vos louvem!
A terra produziu os seus frutos.
O Senhor nosso Deus nos abençoa.
Deus nos dê a Sua benção;
e chegue o Seu temor aos confins da terra!

Oremos

Senhor nosso Deus,
Pai de misericórdia e fonte da salvação humana,
que constituístes o vosso servo Carlos rei de Portugal
e a seu filho Luís Filipe príncipe herdeiro,
dignai-Vos conceder por intercessão
da Virgem Maria, na sua Imaculada Conceição, Rainha de Portugal,
o perdão dos seus pecados,
a paz e a conversão do seu povo,
a misericórdia para com os seus inimigos,
e a bem-aventurança eterna na pátria celeste.
Por NSJC.

Autor: Padre Pedro Quintela
Lido pelo próprio no Terreiro do Paço, em 1 de Fevereiro de 2008.

segunda-feira, fevereiro 04, 2008

O meu voto de pesar

Quando a assembleia da república recusa um voto de pesar pelo assassínio do Rei Mártir, que era o Chefe de Estado Constitucional na altura dos trágicos acontecimentos, isso só pode significar que o regime vigente se identifica com os criminosos, com a impunidade, e esclarece de uma vez por todas aquilo que disfarçava a todo o custo – sem este crime a república nunca se teria implantado em Portugal.
Mas também explica o impressionante registo criminal de cem anos de regime republicano: neste período foram assassinados dois chefes de estado, um candidato á chefia de estado e um primeiro-ministro! Monstruoso record, indigno de uma nação civilizada! Responsabilidades nunca existiram! Culpados também não! Provávelmente estarei a recordar aquilo que as almas mais sensíveis gostariam de esquecer, mas sem memória não existiremos como povo, sem verdade não existiremos como homens.
Reconciliação rima com perdão, mas com terroristas confessos, que ainda não se arrependeram, não há reconciliação possível.
É este o meu voto de pesar, voto de pesar por Portugal.

sexta-feira, fevereiro 01, 2008

Cem anos de decadência

Faz hoje cem anos que matámos o rei, o dia amanheceu solene e triste, as primeiras notícias confirmam o que esperávamos, o bastonário da ordem dos advogados cumpre os serviços mínimos para que foi eleito – interferir e descredibilizar ainda mais o processo da Casa Pia.
Há cem anos, o processo do Regicídio também se perdeu nos gabinetes da primeira república, a verdade nunca se apurou, e a impunidade venceu.
Faz hoje cem anos que perdemos o fio à meada, não admira portanto que tenhamos perdido o sentido comunitário da honra, da liberdade e da independência.
Acreditamos hoje que o crime do Terreiro do Paço, e as sucessivas (e inevitáveis) revoluções republicanas que lhe seguiram, serão as grandes responsáveis pelo atraso a que estamos votados.
Sabemos hoje, apesar da censura, da propaganda, das várias cumplicidades, que o rei foi um extraordinário estadista, que visava longe, desde logo a reforma do estado, o reforço da centralidade atlântica, a investigação e valorização dos nossos recursos marinhos, que tão bem conhecia, mas sobretudo, a defesa e o desenvolvimento dos territórios africanos que estavam à nossa guarda. Nesse sentido, o Príncipe Luís Filipe, herdeiro do trono, viajou até Àfrica naquela que foi a primeira deslocação de um membro da família real às colónias portuguesas.
Mas também sabemos que o espírito reformador do rei colidia com os interesses instalados, e na política externa, com os interesses das grandes potências, que cobiçavam as nossas colónias. Tudo isso, tudo junto, compôs o cenário do crime. Tudo isso, tudo junto, foi ganho pelo atentado.
Cem anos depois, a reforma do estado continua por fazer, o rotativismo que vivemos é o mesmo, ou pior, a justiça não funciona, e trocámos a centralidade atlântica, base secular da nossa independência, pela periferia de uma união europeia que pode falir a qualquer momento.
Com tudo isto, e tudo junto, cem anos depois, passámos de uma média nação europeia para a cauda da Europa!
Por tudo isto, faz todo o sentido, que todos juntos, evoquemos os cem anos da morte do Rei Dom Carlos.
Que esta homenagem seja o primeiro passo para reconciliação de Portugal com a sua história.