segunda-feira, janeiro 30, 2006

Faltam os ossos...

O paradigma mental que subsiste neste Portugal dos pequeninos, tem sido abundantemente dissecado por uma série de génios, mas o diagnóstico enferma quase sempre daquele problema que o direito apelida de ‘parte interessada’.
Com o possível distanciamento, permitido por uma longa oposição ao regime, tento adivinhar o percurso mental que se esconde por detrás da brilhantina:
- Casam-se ‘fontismos’ com ‘progresso’, a propriedade é um mal que convém ter sempre presente, nós fomos grandes apesar dos Reis, e uma bela de uma ditadura nunca fez mal a ninguém! Ainda por cima se assentar nas ‘Lendas e Narrativas’!
Até agora não disse nada, talvez com um exemplo a gente lá chegue:
- O Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que temos, anda preocupado com a ‘avaliação de 11 milhões de parcelas de propriedades rústicas’, que ‘a despeito de serem propriedades de rendimento tributário baixo’, por uma questão de ‘equidade’ precisam de ver ‘actualizados’ os respectivos valores tributários! Tudo isto por causa dos municípios menos populosos do interior do País, que não beneficiam das taxas de construção...
Já perceberam?
Aquilo empobreceu, os proprietários das courelas tiveram que emigrar para o litoral para sobreviver, logo, há que aumentar os impostos a esses absentistas, porque como diz o ditado – ‘quem não tem dinheiro não tem vícios’!
Neste caso, o que é que descobrimos por baixo da careca?
O ódio à propriedade dos outros, a ditadura do Estado centralizador à boa maneira napoleónica, e finalmente, o pior – a incompreensão entre progresso e desenvolvimento!
Em lugar de semear qualquer coisa para que o deserto deixe de ser deserto, em vez de dar alguma coisa aos que heroicamente mantêm o que lhes foi legado, quer apressar o fim da transmissão.
Roeram-lhes a carne, preparam-se para lhes roer os ossos...

sexta-feira, janeiro 27, 2006

País condicional

O que ouves por essas praças perdidas na cidade? Fala sem rodeios, fiel cavaleiro da desventura.
Majestade, os portugueses continuam divididos, queixosos, recriminam-se uns aos outros, estão descrentes, usam muito aquela palavra ’se’...
Como assim, explica-te!
Por exemplo, dizem que ‘se’ Vossa Alteza não tivesse enxotado o Calatrava, a Galiza podia fazer parte do Condado ou quem sabe do Reino!
Que se não fora aquela rivalidade entre Braga e Santiago... Se aquele Afonso antepassado, não fosse tão feroz com Inês e se pelo contrário, o Formoso fosse mais feroz com Leonor...
E dizem mais:
Se o Condestável não fosse tão forte, se o Príncipe Perfeito não fosse tão perfeito, se tivéssemos conseguido ‘enlaçar a soberba cintura de Castela’, se não tivéssemos perdido o rumo da Índia, se Alcácer não fosse Kibir, se o Desejado tivesse morrido, se D. João VI não tem fugido para o Brasil, se houvesse um D.João VI para ter fugido para Angola...
Se ao menos Castela não nos estivesse a enlaçar pela cintura...
Majestade, é por tudo isto que falam, e ainda dizem que a culpa é Vossa!
E de quem mais poderia ser, cavaleiro!?

quinta-feira, janeiro 26, 2006

‘Os Dramas de Cavaco’

Com a devida vénia, transcrevo um artigo assinado por Tomás Dentinho, Director do Jornal ‘A União’ de Angra do Heroísmo:

“Cavaco Silva ganhou as eleições presidenciais. Muitos parabéns para ele e para os outros candidatos que durante vários meses tiveram de responder ao desenho de campanha eleitoral moldado em grande parte pelos órgãos de comunicação social.
Houve esclarecimento e não é legítimo afirmar que os eleitores desconheciam o pensamento e a forma de estar e de agir de cada um dos candidatos. Sendo assim, fruto da vontade popular, temos um novo Presidente da República.
Vamos a ver se será por cinco anos, por dez anos ou se apenas por um ano e meio. Talvez saia antes do tempo como já fez em 1980, com a morte de Sá Carneiro, e em 1995 antes da vitória de Guterres. Cavaco Silva enfrenta dois grandes dramas. Em primeiro lugar os dramas relacionados com a escolha das pessoas que mais directamente o apoiaram.
Quem vai escolher para o seu Gabinete? Quem vai afastar? Que sinais vai dar aos vários grupos de pressão?
Será que vai escolher uma equipa técnica e da sua confiança, ou vai dar um espaço de intervenção especial à Igreja, aos militares, aos sindicatos, aos empresários, às ordens profissionais, aos jornalistas, aos jovens, às várias curibecas, às várias regiões e aos diversos países. Na verdade, tratando-se de certa forma de uma vitória previsível é natural que os vários interesses se tenham acomodado junto do provável vencedor. Será que Cavaco Silva sabe o que representam ou tem-nos apenas pela sua competência técnica?
Quem irá escolher não é inócuo e é bom que a comunicação social esteja atenta à formação do Gabinete porque certamente será uma espécie de governo sombra ou luz do actual governo. Em segundo lugar Cavaco Silva tem de enfrentar os problemas do país e de todos nós. Aliás não terá sido eleito por qualquer outra razão. A crise da competitividade externa e os problemas das finanças públicas, as complexidades da segurança social e os traumas do sistema jurídico, as hesitações face à Europa e os desafios da globalização.O que é preciso fazer é mais ou menos óbvio. É necessário emagrecer e dar produtividade ao Estado. É urgente atrair o investimento estrangeiro e dar garantias ao investimento nacional. É crucial melhorar a educação e a investigação científica. O Governo sabe disso mas os passos que tem dado são manifestamente insuficientes. Será que a eleição de Cavaco Silva vai garantir e estimular reformas mais efectivas. É provável. No entanto, se Cavaco Silva se colar muito às reformas urgentes é natural que uma grande parte do país reaja negativamente contra ele e contra o Governo. Neste caso o papel de árbitro de Presidente da República passará para segundo plano e agravar-se-ão as divisões dentro do país. Se assim for o mandato termina dentro de um ou dois anos. Resta contudo o exterior. É face ao exterior que se ganha competitividade. É com o estrangeiro que se ganha investimento.
É com os outros países que se clarifica a Europa e se define o nosso papel na globalização. E se assim for o principal parceiro do Governo de Cavaco Silva não é José Sócrates mas sim o centrista Diogo Freitas do Amaral.
Estranhezas do regime.”

Jornal ‘A União’ de Angra do Heroísmo, em 23 Jan.2006

segunda-feira, janeiro 23, 2006

A noite eleitoral

A previsão mais certeira sobre os resultados eleitorais foi dita no fim da Missa de Domingo a que assisti.
O Padre celebrante já se despedia dos fiéis quando olhou o relógio e comentou: - “já passa das oito, Almada está em silêncio, não se ouvem carros nem buzinas, parece que o ‘Benfica eleitoral’ não está a ganhar...”!
O Padre nunca o admitiu, mas eu sei que ele também é...do Belenenses!
De facto, no caminho de casa, ao atravessar uma Almada emudecida, não pude deixar de fazer a seguinte pergunta à minha memória: - será que, depois de trinta anos, a ‘maioria silenciosa’ conseguiu chegar a Belém?!
A resposta obtive-a quando cheguei junto do pequeno ecrã, não apenas pela clareza dos números mas principalmente pela expressão tristonha de todos os participantes, fossem os envolvidos, fosse a envolvente!
Quanto à envolvente, fixei-me na TVI por uma série de razões: - estava lá a Manuela Moura Guedes, com quem simpatizo, porque diz tudo o que lhe vem à cabeça, mas com uma enorme generosidade. Para além disso, Manuela torna-se indispensável quando uma das pessoas convidadas é a Ana Drago. Com uma marcação impiedosa Moura Guedes ‘secou’ aquele perigoso ‘repuxo de jardim’ que nunca nos deixa beber àgua sossegados!
Estavam também a Constança em despique com o Miguel Sousa Tavares, os discretos Ruben e Inês Pedrosa, o economista Borges, e a combativa Maria José Nogueira Pinto que, de vez em quando, era maltratada pelo pivot de serviço!
Se me perguntarem sobre o que é que discutiram durante toda a noite, respondo que não sei. Percebi apenas que ninguém estava contente!
Já no que respeita aos envolvidos, era relativamente fácil de adivinhar quem estava mais zangado. Sem dúvida, Soares e Louçã, afinal os grandes derrotados da noite. Por coincidência, era nas respectivas sedes de candidatura que os aplausos eram mais frenéticos!
Os discursos também não enganam: - Louçã, com os 300 mil votos que obteve, vai avançar para a ‘política de solidariedade’, a expressão é dele, que já conhecemos – aborto, casamento de homossexuais, eutanásia, e...mais emprego com menos trabalho!
- Soares, também muito aplaudido, não estava bem. Chamado à última hora para apagar os fogos do regime, parecia desconfortável nesse ingrato papel.
Dos outros ficámos a saber que Jerónimo ganhou bem o seu jogo particular com o Bloco de Esquerda, que Garcia Pereira precisa de trezentos portugueses para descobrir um que simpatize com o MRPP (!), e que Alegre acabou por ser derrotado ‘por umas décimas’, fim de citação.
Por último, o primeiro, o cartaginês de Boliqueime, que conseguiu derrotar o Império! Não foi tarefa fácil e sabemos que o mais difícil está para vir.
Pois é, o número de ilusionismo do costume vai continuar a não funcionar: - ‘serei o Presidente de todos os portugueses’!
Era preciso que os derrotados deixassem ou que os vencedores quisessem, o que é a mesma coisa.
Por isso é que a guerra civil recomeça amanhã, ou hoje mesmo.

domingo, janeiro 22, 2006

PORTUGAL

Ó Portugal, se fosses só três sílabas,
Linda vista para o mar,
Minho verde, Algarve de cal,
Jerico rapando o espinhaço da terra,
Surdo e miudinho,
Moinho a braços com um vento
Testarudo, mas embolado e, afinal, amigo,
Se fosses só o sal, o sol, o sul,
O ladino pardal,
O manso boi coloquial,
A rechinante sardinha,
A desancada varina,
O plumitivo ladrilhado de lindos adjectivos,
A muda queixa amendoada
Duns olhos pestanítidos,
Se fosses só a cegarrega do estio, dos estilos,
O ferrugento cão asmático das praias,
O grilo engaiolado, a grila no lábio,
O calendário na parede, o emblema na lapela,
Ó Portugal, se fosses só três sílabas
De plástico, que era mais barato!

Doceiras de Amarante, barristas de Barcelos,
Rendeiras de Viana, toureiros da Golegã,
Não há ‘papo-de-anjo’ que seja o meu derriço,
Galo que cante a cores na minha prateleira,
Alvura arrendada para o meu devaneio,
Bandarilha que possa enfeitar-me o cachaço.

Portugal: questão que eu tenho comigo mesmo,
Golpe até ao osso, fome sem entretém,
Perdigueiro marrado e sem narizes, sem perdizes,
Rocim engraxado,
Feira cabisbaixa,
Meu remorso,
Meu remorso de todos nós...

Alexandre O’Neill (1965)

sexta-feira, janeiro 20, 2006

Souto Moura entre os pigmeus

A Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias da Assembleia da República conseguiu parte dos seus objectivos.
Obrigar Souto Moura a explicar-se, no seu território, sobre a última ‘inventona’ jornalística, que como se sabe se destinava a comprometer o processo da Casa Pia, e, se possível, baralhar as eleições presidenciais.
Mas a coisa correu muito mal para os deputados e explicou de certo modo, porque é que é tão difícil afastar Souto Moura!
Ele foi o Vitalino Canas e o seu longo intróito que ninguém percebeu, ele foi o Nuno Melo preocupado com os rabos de palha do seu partido, ele foi a Ana Drago armada em esperta, ele foi o Filipe, e o outro, e também o outro da voz grossa, a dizer enormidades! A Maria de Belém nunca falta, aquilo estava cheio!
Durante quatro horas Souto Moura explicou, demonstrou e ensinou, sempre com clareza, sempre com competência, sempre educado!
E confirmámos as nossas previsões – a coisa está preta!
Mas esta audição acabou por ser útil! A diferença de nível entre o Procurador e aqueles ‘representantes do povo’ é abissal!
Eleitos através de listas partidárias, que por sua vez são escolhidas pelos aparelhos dos vários partidos, não têm qualquer ligação com os representados, são meros burocratas da política que não servem para nada.
Se não existissem, se ficassem em casa a ver telenovelas, Portugal progredia de certeza.
E já me esquecia de vos contar – estava lá aquela jornalista, a Felícia Cabrita, a que despoletou o processo da Casa Pia, lembram-se?
Com um sorriso enigmático!

quinta-feira, janeiro 19, 2006

Sobre as Presidenciais

Quando eu era pequeno veio visitar-nos a Rainha de Inglaterra.
Isabel II foi recebida com entusiasmo pelo povo de Lisboa e com o devido respeito pelo Presidente da República de então, General Craveiro Lopes.
Pensando hoje nesse episódio posso afirmar o que na altura apenas pressentia – o efectivo desequilíbrio de forças entre as duas nações aliadas, acentuava-se naquele confronto de representantes. O povo de Lisboa sentiu decerto o mesmo – estava ali a Inglaterra ao lado do Presidente da Republica Portuguesa, nome demasiado comprido para tão curta representação!
O tempo entretanto passou e passaram também pela Presidência da República, a seguir a Craveiro Lopes, Américo Tomás, Spínola, Costa Gomes, Ramalho Eanes, Mário Soares, Jorge Sampaio e... o próximo! E mais seriam se não tivessem havido reeleições!
Mas a Rainha de Inglaterra é a mesma!
Neste trânsito político, quantas feridas abertas, quantas divisões, quantos golpes, quanta instabilidade... afinal tudo ao contrário do que prometem e anunciam os actuais candidatos!
E eu pergunto: - em nome de quê, ou por alma de quem, vamos continuar a dar tiros nos pés?

quarta-feira, janeiro 18, 2006

PÁTRIA

Foste um mundo no mundo,
E és agora
O resto que de ti
Já não posso perder:
A terra, o mar e o céu
Que todo eu
Sei conhecer.

Foste um sonho redondo,
E és agora
Um palmo de amargura
Retornada.
Amargura que em mim
Também nunca tem fim,
Por ter sido comigo baptizada.

Foste um destino aberto,
E és agora
Um destino fechado.
Destino igual ao meu, amortalhado
Nesta luz de incerteza
E de certeza
Que vem do sol presente e do passado.

Miguel Torga
Coimbra, 28 de Abril de 1977

terça-feira, janeiro 17, 2006

A alma deles

Segunda-feira, noite de ‘prós e contras’, discutia-se a alma da Pátria!
Com os ateus em larga maioria, o diálogo estava inquinado à nascença, já que a expressão ‘alma’ é para eles tudo – hino, bandeira, Figo, sardinha assada – menos alma!
Neste aspecto houve participantes que excederam as melhores expectativas! Clara Pinto Correia, por exemplo, cheia de alma e sem qualquer cerimónia, levou-nos para a intimidade da sua casa, dos seus filhos, dos seus casamentos, do seu candidato, e tudo isto com o maior respeito pelo hino. Imagine-se que até obrigou os filhos a irem a pé a Fátima, porque é importante. Nesta altura a Fátima em pessoa sentiu-se interpelada e achou por bem cortar-lhe a palavra, mas não conseguiu.
Clara Pinto Correia ainda tinha que nos fazer uma revelação – a alta cultura vai acabar com ela, no melhor sentido da expressão!
Nandim não aceitou a catástrofe e lembrou que os portugueses tinham inventado a ‘via verde’! E não se ficou por aqui – quando se reconhecia que os países mais desenvolvidos da Europa eram monarquias, Nandim reagiu lembrando-se dos Estados Unidos, como poderia ter-se lembrado da China. Só para contrariar! Mas concedeu a existência de um monárquico no Conselho de Estado! Supõe-se que para presidir!?
Estavam também dois jovens com visuais opostos: um de fato e gravata, da área do marketing, que disse que os portugueses são saloios o que não me pareceu mal, e outro, na linha do semi-prec, que me fez lembrar a Ana Drago, mas mais alto e com barba. Deve sentir-se um génio e disse umas vacuidades.
Para a segunda parte Fátima Campos Ferreira ameaçou com a ‘representação da alma Lusitana’! Foi o bom e o bonito. Os republicanos ali presentes tentaram em desespero de causa construir um impossível super-homem. O pobre presidente seria o resultado do cruzamento da força de um novo Hércules com a beleza da nova Cleópatra!
O jovem do marketing esteve bem outra vez e disse que isso não ía resultar!
Por obra e graça do Espírito Santo, a noite foi salva pelas brilhantes intervenções do professor Adelino Maltez que conseguiu conquistar, não digo a compreensão dos restantes, o que era pedir muito, mas ao menos algum silêncio! Nesse silêncio regenerador coube ainda a memória viva do Padre Colimão sobre a passagem dos portugueses pela Índia, bem como os esforços desesperados da moderadora para trazer para a discussão a palavra proibida – El-Rei!

segunda-feira, janeiro 16, 2006

‘As quatro repúblicas e a monarquia’

No horizonte dos séculos, ou dos milénios, da História de Portugal, estes quinze dias de campanha febril não são coisa nenhuma. Mas em tão pequeno tempo, burocraticamente determinado e medido, quantas paixões, quantos anseios, quantos ódios ficam bem abertos e tão mal fechados…
Na perspectiva do pensamento político, o melhor comentário desta corrida alucinante pertence ao duque de Bragança, na conferencia de imprensa dada na véspera do 1º de Dezembro, quando já se sentia por todo o País o cheiro a chamusco, e lhe perguntaram pela proximidade a que se situava de cada um dos quatro candidatos. Dom Duarte de Bragança respondeu soberanamente, que a todos permanecia equidistante. Em nenhum votaria, por ser o representante dos reis de Portugal. Mas nenhum considerava indigno de receber o voto de cada português monárquico.
Para muitos milhares de portugueses, vive-se, nestes dias, uma hora grande. Aqueles para quem a república não é apenas um artifício jurídico ou uma ideologia, nascida (e quase logo morta) nos últimos anos do século XVIII – esses que sinceramente participam no drama comunitário, e sofrem e gozam com as vicissitudes da pátria –, esta eleição presidencial aparece como momento alto de convivência, sinal e anúncio de uma existência mais digna, e até modelo de paixão colectiva.
Para mim, monárquico que nunca se conheceu republicano, nada custa reconhecer uma certa grandeza neste fervor de cidadania. Mestres meus, entre os maiores, um Pequito Rebelo, um Fernando Amado, um Rolão Preto, prestaram homenagem ao espírito republicano (ou democrático) tantas vezes expresso ao longo da História contemporânea de Portugal. E a maior lição de Paiva Couceiro foi a sapientíssima suspensão de juízo com que enfrentou os destinos, olhos atentos à vontade popular.
Cada república, das quatro que se reclamam da verdade e do todo, cada república parece erguer-se com o esplendor e a glória da Monarquia. A nenhuma falta – dir-se-ia – a capacidade para se arvorar em totalidade. A bandeira, o emblema, o simples nome agitado ao vento – nada se prende na dimensão individual de cada um dos candidatos. Quase que o mundo é pequeno (como diria o padre António Vieira) para este humaníssimo desatino…
A sabedoria das nações, que é feita de tempo e espaço, mas também de carne, sangue vivo e espírito, saboreia (como lhe cumpre) essas multiformes tentativas de reconstruir a unidade, cada qual partindo de um canto estreme do real.
Como já alguém observou, a candidatura mais próxima, não propriamente do ideal da realeza mas da realeza como abstracção, é provavelmente a de Francisco Salgado Zenha, de tal modo ele surge independente da opinião, gerado (como candidato à Presidência) no mistério e numa espécie de fatalidade intrínseca; por outro, inpenitentemente circunscrito aos trâmites constitucionais, gravemente embalado no prestígio da lei; e, ainda, definido como sucessor. Não fora a estranha (alheia ao próprio candidato?) obsessão de se apresentar como fautor, por artes ignoradas, de uma Nova Democracia e de uma Nova República, e Salgado Zenha seria, de algum modo, o mais próximo avatar do rei constitucional. Falta-lhe, porém, embora “homem de palavra”, a verdade de tudo isto.
Aparentemente da mesma origem ideológica, mas a milhas de distância no que diz respeito à invenção da candidatura, Mário Soares aparece, com certeza, como o mais natural de todos os candidatos, não apenas efectivos mas possíveis. Ninguém como ele está e esteve sempre no interior do processo, quer na sua preparação longa e trabalhosa, quer na sua expressão, generosa e oscilante, quer ainda nos seus limites, exasperantes e ao mesmo tempo esperançosos. Na sua insegurança, dir-se-ia perpassar a promessa da segurança. Na sua bonomia facilmente caricaturável anda talvez a garantia de uma certa firmeza. Da imagem tradicional do rei, fica-se ao nível de Dom Luís. Mas já não é mau. O homem das mil promessas, desta vez nada promete. Esperava-se por ele: limita-se a aparecer. Vem de várias esquinas da História. Nem sempre se poderá louvar o que fez ou deixou fazer. Mas não há dúvida de que é Mário Soares. E já é alguma coisa.
Diogo Freitas do Amaral, o candidato evidente para quem já se esqueceu de que, há cerca de um ano, declarou rudemente que não seria candidato, é tão infinitamente superior a qualquer outro em ciência jurídica e em teoria do Estado que nem valeria a pena abrir um processo eleitoral se a questão das questões fosse, efectivamente, a da preparação universitária, a da visão geral das coisas, a da rapidez e segurança das respostas académicas a qualquer problema de administração pública. Presidente de todos os portugueses (com excepção dos Vizelenses), Freitas do Amaral passeia pelo País as suas lembranças vivas de grandes mortos. (Aqueles de quem fala e aqueles em quem se pensa.) Há, na sua campanha e sobretudo na sua candidatura, uma perfeição que também evoca a monarquia, mas uma monarquia a que se houvesse extraído, num golpe de altíssima e triste cirurgia, a marca do espontâneo, a origem popular, a simbologia. Inesperadamente, o candidato de tantos monárquicos sinceros (e de todos os não sinceros) adianta um projecto global de Nova República. Falta-lhe a Nova Democracia para ser igual a Zenha. Mas é, pessoalmente, um democrata rodeado, não direi de anti-democratas, mas de abundantes ademocratas. Discípulo de Raymond Aron, tem um modelo como estadista: Fontes Pereira de Melo. A monarquia constitucional parece prestes a reviver, com ele, uma experiência cinzenta, ameaçada de tensões brutais.
Ao lado ou em frente destas três candidaturas do stablishment, o nome e a voz, o sonho e a vontade de Maria de Lurdes Pintasilgo podem trazer, sem saudade, o melhor da tradição portuguesa e cristã. Rodeada de alguns que dela apenas compreendem o (aparente) antipartidarismo, ou a política um tanto ou quanto caseira, a verdade é que Lurdes Pintasilgo parece a única personalidade capaz de tocar em todos os temas escaldantes das ideologias contemporâneas com criatividade eficaz e sem obedecer a pautas registadas em manuais. Daí o espanto e o medo que provoca nas hostes comunistas oficiais: dir-se-ia que esta mulher cristã e desempoeirada se prepara para arrebatar ao PCP a parcela melhor dos seus militantes. O que ameaça, afinal, o seu belo projecto é exactamente a ideia singular (já de vários modos anotada por amigos e adversários) de fazer a partir da Presidência da República essa revolução.
Das quatro “repúblicas” que se perfilam no horizonte português e se olham e medem de soslaio, é certamente a última aquela que mais positivamente pode contribuir para o Portugal monárquico que o futuro exige. Mas esta candidata é intelectualmente contemporânea de Platão; para ela, Aristóteles ainda não nasceu…Distinguir entre Estado e sociedade civil, entre a pólis e a família (conforme muito oportunamente lhe observou Freitas do Amaral) parece estar fora do entendimento desta mulher sem dúvida inteligente e culta. Cabem também na monarquia quer a paz social que Mário Soares promete e directamente procura, quer a ideia clara de um verdadeiro Estado forte, alimentada e pregada por Freitas do Amaral, quer ainda a única invenção de Salgado Zenha – essa um tanto utópica transparência da administração pública, talvez necessária para acabar de vez com o regime republicano.
Nas vésperas de uma eleição que directamente, como militante monárquico, me não diz respeito, mas que não posso deixar de sentir e viver como português que antes de tudo sou e para quem estão mais próximos os republicanos portugueses que os monárquicos espanhóis ou ingleses, apenas desejo que os portugueses não tenham de sofrer muito mais desastres e desilusões antes de se convencerem, por um acto sereno de inteligência, que tudo quanto é autenticamente republicano tem lugar em monarquia.

HENRIQUE BARRILARO RUAS
(As Presidenciais - DN Opinião de 24 de Janeiro de 1986)

domingo, janeiro 15, 2006

Estorvo ou álibi?

Se calhar nem uma coisa nem outra! Ninguém sabe!
Souto Moura é por certo uma pessoa séria, civilizada, vê-se à distância. Por azar, por carreira, por uma natural ambição, achou-se a servir a República na hora errada em que alguém, inadvertidamente, abriu a ‘caixa de Pandora’ onde repousavam os pequenos segredos, os grandes delitos, até os vícios privados, desta família siciliana que nos governa. Para ser mais correcto, são duas famílias, mas com um ascendente comum.
O problema são os vícios privados!
Que não são assim tão privados porque a família sente-se dona disto e usa e abusa daquilo a que chamamos Estado à sua vontade! Deu-lhes tanto trabalho a conquistá-lo, (aproximadamente oito séculos), era só o que faltava se agora não o pudessem utilizar de acordo com os seus desígnios!
Mais um problema, portanto, para Souto Moura.
A família está apesar de tudo aflita! O termo é desesperada! Trocavam bem os negócios, a Chefia de Estado, tudo o que fosse possível, pela inexistência, supressão, abafamento desse maldito processo da Casa Pia.
E não olham a meios – inventam tenebrosas listas de escutas, disparam para todos os lados, põem em risco a própria segurança do Estado, do seu Estado, na secreta esperança de que surja uma solução que eles ainda não têm!
À falta de melhor, toca de atirar culpas para cima do Procurador!
É neste filme de terror que têm que ser analisadas as declarações irresponsáveis de Mário Soares – ‘é preciso acabar com as escutas’!
Então vamos acabar com as escutas por causa da Casa Pia? O País pode ficar a saque, não vá descobrir-se que na família existem pedófilos? Já avisaram os terroristas que tencionam acabar com as escutas?
Perderam a cabeça! Manter ou demitir Souto Moura é igual!
É a reputação da família que está em causa.
‘O resto é bilros’.

quinta-feira, janeiro 12, 2006

‘El-Rei no Porto’

Quando as milícias do Vieira já controlam o aeroporto de Lisboa!
Quando o primeiro-ministro investe todas as poupanças no Benfica!
Quando os socialistas, mais ou menos poéticos, ameaçam a Chefia de Estado!
Quando, finalmente, um imprevidente trotskista frequenta os camarotes da Luz!
A ficção pode tornar-se realidade. Isto sem falar no seguidismo da Imprensa!
Fernando Venâncio nunca teria imaginado tal concurso de circunstâncias, porque se assim fosse, o seu ‘El-Rei no Porto’ não seria uma obra de ficção mas uma profecia.
Recordemos o enredo: - No rescaldo de umas eleições presidenciais, o Norte, sentindo-se ludibriado, na política e no futebol, separa-se e proclama a monarquia.
O Sul mantém-se laico, republicano e socialista.
No País dividido, existe um jornalista apaixonado, uma mulher do sul, e um triângulo amoroso. O Rei do Norte acaba por conquistar o troféu.
Referi-me ao livro, mas a realidade não anda longe!
Os factos acima descritos conjugados com o resultado das próximas eleições, podem fazer descambar a situação. Na melhor das hipóteses seremos apanhados na terra de ninguém, nalgum abrigo precário, num cenário tenebroso – o Sul estará infestado de bandos de aves de rapina e leões famélicos, ainda por cima socialistas.
É obrigatório ter um plano.
O paralelo de Rio Maior costuma oferecer alguma segurança, a coberto das célebres ‘mocas’, já utilizadas com êxito noutras ocasiões, e contra os mesmos infiéis! Lá terá de ser outra vez.
Para um monárquico belenense ou belenense monárquico, como queiram, não existe alternativa. É preciso rumar a Norte, e dali esperar um sinal, o ramo de oliveira, que anuncia o fim do dilúvio verde e encarnado.
Saga bem difícil de imaginar! Mas existem destinos piores!
Quando me lembro daqueles que sempre aspiraram viver num País civilizado, mas em virtude (ou será defeito?) dos símbolos e das cores que escolheram, vão ter que continuar a vegetar numa democracia popular, ao velho estilo soviético...até me dói o coração!
E a monarquia aqui tão perto!...

terça-feira, janeiro 10, 2006

Sinais de mudança

Há qualquer coisa a mover-se na política portuguesa.
Ignorado pelos ‘media’, o recente Congresso da Causa Real encerrou com um frente a frente entre monárquicos e republicanos, que a avaliar pelos relatos de alguns dos intervenientes, decorreu sob o signo da elevação e da seriedade! Dois aspectos, que para já, destoam da crispação e mera propaganda em que sempre recaíram anteriores confrontos.
Não houve portanto vencedores nem vencidos entre os oponentes, três de cada lado, que ali foram esgrimir argumentos a favor da sua Dama. Pelos monárquicos estiveram Gonçalo Ribeiro Telles, Mendo Castro Henriques e Adelino Maltez, enquanto que as hostes republicanas eram representadas por João Soares, Nandim de Carvalho e Manuel Monteiro.
Deixando por agora de parte os aspectos mais concretos deste curioso e interessante debate, a que repito, não assisti, gostaria no entanto de chamar a Vossa atenção para alguns dos sinais que julgo pressentir, na minha qualidade de peregrino deste longo Interregno:
Em primeiro lugar uma constatação: o regime republicano começa a sentir que não tem capacidade nem condições para defender o interesse nacional, mais própriamente, a independência de Portugal. Há muito que percebeu que a União Europeia a que temos direito se chama União Ibérica, e já não consegue iludir a questão.
O episódio da Iberdrola, o desespero da Ota e do TGV, buscando no contexto meramente Europeu, um equilíbrio impossível com a Espanha, é sintoma dessa desorientação e incapacidade.
A situação não é nova. Temos vindo aqui a alertar que a história se repete, que a Independência de Portugal foi um tremendo acto de vontade e coragem, que exigiu e continua a exigir muitos sacrifícios. Os portugueses já vacilaram nessa vontade, já se arrependeram, mas como a memória dos povos sofre das mesmas limitações que a dos indivíduos, cá estamos nós outra vez confinados à palavra (ou será ideologia?) ‘Europa’ e à natural dependência de Madrid.
A monarquia poderá superar ou resolver esta questão?
No citado frente a frente, parece que todos concordaram, alguns por exclusão de partes, que o Rei e a Dinastia, têm melhores condições para defenderem a Independência Nacional.
No ar terá ficado apenas uma objecção e uma dúvida.
A objecção democrática de que qualquer português tem o direito a ser Chefe de Estado. A dúvida sobre o caminho ou o método para restaurar a Monarquia.
Quanto à objecção, vale a pena dizer o seguinte: foi precisamente por causa desta possibilidade teórica que permite que qualquer cidadão aceda à Presidência da República que a Monarquia sucedeu à República e se impôs históricamente. A prática revelou-se melhor que a teoria.
Quanto ao método restauracionista, existem muitas teses, mas por aqui venho defendendo a teoria, mas principalmente a prática da remissão da culpa: - quem fabricou este nó górdio que enreda o Pais há noventa e cinco anos, tem agora a obrigação e o dever patriótico de o desfazer. Caberá aos republicanos restaurar a monarquia. Como?
Colocando o seu peso político, quem o tiver, ao serviço da Pátria.
É simples, basta ter vontade.

sexta-feira, janeiro 06, 2006

Dia de Reis

Neste dia em que a tradição Cristã celebra a chegada dos Reis Magos junto do Presépio, não faz mal recordar um Príncipe Católico do nosso tempo, que durante a sua vida deu testemunho em defesa da vida.
A história é conhecida, mas pouco valorizada e percebe-se porquê:
- Em 1990, o Rei dos Belgas surpreendeu o Mundo ao abdicar por um dia, recusando-se assim a assinar a legalização do aborto no seu País!
Com esse gesto de natureza simbólica, aparentemente inútil, Balduíno expressava a vontade de não ceder à violência do sufrágio universal, erguido como dogma nas sociedades que se julgam livres, mas onde todos os dias se acumulam sinais de dependência.
O Rei não soube nem quis distinguir entre a sua consciência e a consciência da nação. A vida dos seus súbditos, os mais frágeis de todos, estava na sua mão, e por isso não assinou!
Outros o fizeram. Mas os belgas, que na véspera haviam votado contra si próprios, decretando a pena capital para os seus filhos, entenderam a renúncia do Rei como uma espécie de redenção política, que talvez os livrasse do juízo da história. E amaram-no também por isso.
Só que a história não costuma perdoar.
Os arautos da morte falharam a presa, mas a guerra ìa prosseguir.
De então para cá, como numa vertigem, temos vindo a assistir, impotentes, completamente amordaçados, à derrota das consciências, à contrafacção dos valores, ao triunfo do egoísmo e da violência.
A agenda da ‘besta’ aí está para o provar: a seguir ao aborto, temos o casamento dos homossexuais, a legalização da eutanásia, da pedofilia, da bestialidade...
E tudo dentro da maior legalidade, com a Constituição sempre presente! O sufrágio universal, há muito capturado às maiorias ocasionais e acéfalas, é o instrumento perverso de que se servem estes grupos minoritários para obterem os seus fins.
Esta gente não gosta de Balduínos ou de quem lhes ofereça resistência em nome de valores éticos ou religiosos. Mas é por aqui que passa a resistência possível.
Nos dias de hoje já não basta ter razão, é preciso tomar posição.
É nesta perspectiva que a renúncia do Rei dos Belgas ganha outra dimensão, adquire a sua verdadeira grandeza.
Balduíno abdicou por um dia, mas nem por um dia abdicou das suas convicções religiosas. A artimanha da separação da Igreja do Estado não o podia convencer. Ele sabia, como qualquer católico sabe pelo Evangelho, que a passagem de Cristo pela Terra se cumpriu entre a Anunciação e o Calvário.
A esta luz, o seu gesto é indestrutível.

terça-feira, janeiro 03, 2006

O outro discurso

Aquele que será dirigido aos ‘grandes eleitores’, em bom recato, longe dos holofotes e das câmaras de televisão.
Como não vou poder estar presente, deixo à minha e à Vossa imaginação a tarefa de adivinhar o teor desse discurso. Não deve andar muito longe disto:
- Portugueses que me elegeram: - nestes dez anos de exercício que agora terminam, fiz o que faria qualquer Presidente de um Conselho de Administração perante os seus accionistas – garanti os vossos dividendos. Não a todos porque não é possível, os pequenos accionistas vão ter que aguardar por melhores dias.
Já no que toca aos trabalhadores, podemos ficar descansados. O nosso Primeiro se encarregará de lhes pedir os sacrifícios que a situação exige.
Quero dizer-vos que desempenhei o cargo num contexto particularmente difícil, num País que mantém características pouco recomendáveis: os portugueses são maioritáriamente católicos o que dificultou a implementação de algumas medidas contrárias à Fé que professam, sem esquecer a pesada herança colonial originada pelos descobrimentos.
No capítulo interno ergui o futebol como desígnio nacional, propiciando um notável surto de obras públicas que muito beneficiaram os nossos maiores accionistas. E já que falamos em obras públicas, trabalhei em prol de uma boa solução para a Casa Pia, processo que vem ameaçando o nosso bem-estar e o próprio regime em que vivemos.
Mas nem tudo foram rosas. Tive de facto alguns problemas com os primeiros-ministros que não eram da cor, mas nada que eu não tenha resolvido a contento. Por fim, e já na qualidade de biombo, verdadeiro clímax dos poderes presidenciais, deixei passar, entre outros bons negócios, a OTA e o TGV. O que quer dizer que vai haver obras com as naturais derrapagens.
Na política externa não me vou alongar. Seguimos o figurino tradicional, protestamos cá dentro e cumprimos lá fora. Para os que estão menos familiarizados com os negócios estrangeiros, resumo a situação num conhecido ditado popular – enquanto há mesada, há esperança.
Não gostaria de terminar, sem fazer referência ao próximo acto eleitoral que irá designar quem me vai substituir neste cargo. Existem neste momento riscos acrescidos, nuvens que se adensam sobre o futuro do regime, e duas incertezas no horizonte – a Casa Pia e o cheque da União Europeia. Convinha por isso que o eleito já conhecesse os cantos à casa. Mas esse aspecto não é decisivo, como sabem.
Decisivo, é que os pequenos accionistas e os trabalhadores continuem convencidos que eu sou eleito por eles e não por vós. Se tiverem dúvidas, ou quando começarem a ter dúvidas será o nosso fim.
Um Bom Ano para nós.

segunda-feira, janeiro 02, 2006

Mais do mesmo

Confesso que me custa imenso aguentar aquele discurso redondo, adjectivado e palavroso do Presidente Sampaio. Ouvi, por ser o último e por uma questão de decência, para o poder criticar.
É difícil criticar a vacuidade, mas existe ali uma estratégia tão repetitiva, tão mesquinha, tão estúpida, que um monárquico tem a obrigação patriótica de a denunciar. Vamos por partes:
- O Portugal Democrático versus Estado Novo – a descolonização possível por culpa do Estado Novo; a descolonização possível por culpa de haver colónias; por causa da escravatura; dos descobrimentos; etc.
O que correu mal por causa do PREC. Esqueceu-se do jovem Sampaio do PREC?
Timor, idem, idem, aspas, aspas.
- O Portugal democrático versus União Europeia – o que está a correr mal por culpa da União Europeia; porque a Europa já não é o que era; porque não há alternativa à Europa; temos que ajudar a Europa a continuar a ser a Europa que nós queremos que seja; porque nós estamos com a democracia e a razão; e estamos com a Paz (aonde?); esta situação é a mais difícil desde que optámos pela Europa. Saliente-se o esforço patriótico deste Governo que conseguiu garantir a mesada, por não se sabe quanto tempo.
- O Portugal Democrático versus Europa e Estado Novo – nada disto nos estaria a acontecer na Europa se o Estado Novo tivesse sido uma democracia, como a 1ª República, por exemplo; se o Afonso Henriques tivesse sido um democrata; se Portugal não existisse; queria saudar especialmente os nossos emigrantes... e garantir-lhes que hoje Portugal é um País respeitado no Mundo; hoje, nas nossas maternidades, nascem finalmente bebés laicos republicanos e socialistas.
Apesar de todas estas dificuldades, o prestígio da Presidência da Republica é um facto reconhecido por todos os portugueses, por todos os indicadores!!!
Com um ou outro exagero, este é o resumo possível do discurso de Ano Novo do nosso Presidente.
Convenhamos que é curto.

domingo, janeiro 01, 2006

Votos para 2006

Das doze badaladas só me lembro de cinco passas, as outras devo ter engolido à pressa, ou então são repetidas. As cinco de que me lembro, aliás, também são repetidas. Só sei que ando a comer passas há uma data de tempo, e nada.
Recapitulemos, porque os meus desejos até são simples – haja saúde, o euro milhões, aquele manequim estrangeiro que aparece muito na televisão, a monarquia... e que o Belenenses seja campeão.
Mas só agora reparo que tudo aquilo que tenho vindo a pedir, ano após ano, cheio de esperança, não tem nada a ver com os votos! O título deste texto está errado. Senão vejamos: tirando a saúde, que prefiro entregar à Divina Providência, não vá o Governo começar a preocupar-se muito comigo, quer o euro milhões quer o manequim, ainda não fazem parte da Constituição, e não estão por isso, felizmente, sujeitos ao sufrágio universal!
Já no que respeita ao Belenenses a coisa não é tão líquida. Sabemos que o futebol é um desígnio nacional e sendo assim, os resultados não podem estar à mercê da bola que entra ou não entra, isto tem que ter regras, ter a segurança do voto. Será talvez por isso, graças ao sistema dos votos, que eu vejo sempre as mesmas caras, que os donos da bola são sempre os mesmos. Começo a perceber que o problema do Belenenses e dos outros clubes mais pequenos, não é só uma questão de ponta de lança. Vou ter que comer mais passas.
Falta a monarquia, uma aspiração que também tem pouco a ver com votos. Mais, estou convencido que quanto mais votos, pior. Por aqui mandam os donos do sufrágio, os mesmos que estão a organizar o próximo leilão que vai escolher o chefe republicano e que segue a regra de qualquer leilão – será arrematado pela melhor oferta. Não entro nesse jogo. Vou ter que passar.
Estão-me ali a fazer sinais...não sabia que estava em directo! O quê?
- O Belenenses e a monarquia não interessam a ninguém?! Querem que eu diga a frase...e toca a andar?!
Pronto, a frase é a seguinte – desejo a todos um Ano cheio de propriedades... e se o Belenenses fosse campeão não se perdia nada. Quanto à monarquia... Corta. Corta.
Um Bom Ano.