segunda-feira, junho 13, 2005

Ouvindo Caetano Veloso…..

(Sampa)
“Alguma coisa acontece no meu coração
Que só quando cruza Ipiranga e a Avenida São João
É que quando eu cheguei por aqui
Eu nada entendi…
Da dura poesia concreta de tuas esquinas
Da deselegância discreta de tuas meninas…

Alguma coisa acontece no meu coração
Que só quando cruza Ipiranga e a Avenida São João
(…)
E foste um difícil começo…”

Ouve-se e não podemos deixar de gostar! E sorrimos do conhecido complexo de Édipo deste famoso baiano! Depois, é sempre reconfortante sermos criticados em português, ainda por cima com sotaque.
Mas não é isso que hoje me faz atravessar o Atlântico.
Vamos lá acertar algumas contas em nome da “purificação da memória” com os nossos “irmãos” “caçulas”:
Irmãos, não, filhos. Esta história de os filhos tratarem os pais por tu ou por irmãos, deu e dá mau resultado – cria confusão e é deseducativo.
Claro que a culpa é dos pais!
Feita a rectificação, recordemos os passos infelizes de ambos os Países em direcção à República e portanto à decadência:

“No confronto, que requer estudo, entre as condições históricas que cercaram a queda da monarquia no Brasil e em Portugal – ambos os regimes instaurados por D. Pedro IV ou I e onde reinavam, sob a cúpula de uma quase idêntica Constituição, igualmente outorgada pelo mesmo Dador, as duas linhas da sua descendência dinástica – haveria um saldo positivo de virtudes públicas a favor do Brasil.
É estranho, mas, onde se poderia supor menor maturidade política, houve mais dignidade de vida pública.
(…)
A República no Brasil foi implantada por um pronunciamento militar contra o Gabinete, que derivou ocasionalmente para um golpe de Estado …, sem turbulências de momento, a que também não precederam perturbações anárquicas do Parlamento e desvairamento da imprensa. Afora esporádicas manifestações individuais…, foi sempre exemplar o respeito colectivo das corporações partidárias, das casas legislativas, das forças armadas, dos grandes órgãos de imprensa pela dinastia e pela Monarquia.
E, não digo a transição, a substituição do regime operou-se no Brasil sob o signo dum comportamento político mais cordato do que em Portugal: não foram mudadas a bandeira e o hino – símbolos de uma continuidade histórica e de uma tradição nacional que cumpria salvar. Na bandeira, conservadas a disposição e as cores das peças heráldicas essenciais, em campo verde um losango de oiro, apenas foram substituídas (aliás, com muito mau gosto) as armas do Império, de tão alto significado, com a esfera armilar e a cruz de Cristo, por um globo azul salpicado de estrelas e enlaçado pelo dístico positivista.
E no hino, deixada inalterada a música (uma das mais belas no género, pela sua singular vibração marcial), trocaram a letra – no que não houve nem perda nem lucro, por que aos inexpressivos e mal alinhavados versos anteriores sucederam estrofes de um preciosismo monótono e dolente.
Portugal, porém, foi às últimas, em matéria de alteração dos símbolos nacionais: à bandeira azul e branca do Constitucionalismo deram como sucessora (contra a exaltada opinião de Guerra Junqueiro) a bandeira verde e encarnada da propaganda, e ao “Hino da Carta” (que “gingava” – como dizia João da Ega) “A Portuguesa”.
(…)”
* “O ultimo Rei” de Cardoso de Miranda

Que tristeza, até os que ensinámos, nos ensinam…

Entretanto, no Brasil, ficou estabelecido que o novo regime seria ratificado pelo Povo brasileiro. Passados 103 anos sobre a queda da monarquia, esse compromisso foi honrado e os brasileiros decidiram em referendo continuar com o regime republicano.
Em Portugal, como se sabe, os portugueses nunca foram chamados a pronunciar-se sobre nada …

Mas voltando à música de Caetano Veloso, ele, até nem tem razão para se queixar da sua triste orfandade porque teve decerto a oportunidade (que eu que o ouço agradecido, nunca tive) de rectificar essa situação através do citado referendo. Tal como todos os outros brasileiros.E a pergunta que lanço aos vencedores e por isso desembarquei outra vez em terras de Vera Cruz, é simplesmente esta: passados quinze anos, ainda não estão arrependidos da escolha?

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